Comenta o mercado de vendas de automóveis e tendências sustentáveis
'Vendas milagrosas' do Peugeot 208, 2008 e Citroën C4 Cactus perdem embalo
Tratados como 'sucesso' pela Stellantis, modelos oriundos da PSA voltaram a mostrar emplacamentos mais modestos
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Há três meses essa coluna alertava para o ‘milagre’ promovido pela Stellantis nas vendas dos principais modelos da Peugeot e Citroën, marcas abraçadas pela criação da gigante automobilística.
O expediente para essa virada nos emplacamentos é o velho e conhecido esquema de vendas diretas, cuja Fiat, principal marca da Stellantis, pratica há muitos anos. Em suma, essa modalidade de comercialização de veículos envolve o uso do CNPJ, o registro de pessoa jurídica, para realizar o contrato de aquisição.
Há vários benefícios fiscais para empresas cujo intuito original é utilizar os veículos como utilitários ou com funções corporativas, mas a generosa legislação brasileira sempre abre brechas para que essas regras sejam usadas de formas menos convencionais.
A Stellantis viu nisso um filão e o tem explorado de forma bastante desproporcional à outras marcas. Antes era mais comum que esses emplacamentos envolvessem modelos mais simples, mas hoje SUVs como o Renegade e o Compass têm a maior parte das vendas para ‘PJs’.
Em queda
Claro que não seria diferente com os modelos 208 e 2008, da Peugeot, e C4 Cactus, da Citroën. Os três, embora com uma proposta interessante e moderna, nunca caíram no gosto do consumidor brasileiro, calejado com o descaso das marcas francesas em seu período de sucesso, no início dos anos 2000.
Mas nas mãos da Stellantis, a impressão é que faltava apenas um ‘polimento’ no visual para que eles fossem ‘descobertos’ pelo público. O levantamento atualizado de AUTOO, no entanto, mostra que os três automóveis continuam patinando no varejo, onde são fechados negócios com “pessoas físicas”.
O hatch 208, agora produzido na Argentina, chegou a emplacar 475 unidades em maio no varejo, mas no mês passado foram somente 196 carros. Já o irmão SUV 2008 voltou a ter um patamar de emplacamentos parecido com a fase pré-Stellantis, com 158 clientes fechando negócio por ele em junho. Em agosto, apenas 73 pessoas apareceram nas lojas da Peugeot para comprá-lo.
O C4 Cactus, único automóvel da Citroën à venda no Brasil no momento, até tem mostrado um crescimento constante no varejo, mas mal supera as 400 unidades.
Favoritos do atacado
O cenário nas vendas diretas, por outro lado, seguia para cima até julho. O 2008 bateu em 871 unidades, o 208, em 1.385 e C4 Cactus, em 1.862 unidades. O SUV da Citroën e hatch compacto da Peugeot, inclusive, foram o 5º e o 7º veículos mais vendidos no atacado naquele mês, numa lista que trouxe nada menos que oito modelos da Stellantis nas primeiras posições.
Todos os três, no entanto, despencaram em agosto, de forma completamente desproporcional ao que se viu no varejo.O hatch 208 conseguiu 1.024 unidades vendidas, o 2008, 582 carros, e o Cactus, 1.291 veículos.
O que poderia provocar tamanho desinteresse instantâneo nos três e ao mesmo tempo? Uma das hipóteses seria a paralisação da produção, afetada pela falta de componentes.
A fábrica de Porto Real, por exemplo, havia parado apenas três dias até julho enquanto a bem maior Betim ficou com as linhas de montagem suspensas por uma semana. Portanto, parece muito pouco tempo para causar um desabastecimento tão significativo.
Se fosse bom todos fariam
Fato é que não se trata de um comportamento normal, seja ele para cima ou para baixo. O mercado automobilístico é conhecido pelas ‘maquiagens’ nas vendas há bastante tempo.
Há quase duas décadas, a referência de vendas era o faturamento dos veículos para as concessionárias, mas algumas marcas começaram a antecipar esses repasses para inflar números, levando o mercado a considerar apenas os emplacamentos como dado confiável.
Nem isso bastou já que parte das montadoras passou a emplacar seus carros junto às lojas para melhorar seus números, mesmo que os veículos não tivessem compradores.
Seja o que faz a Stellantis gostar tanto do mercado de vendas diretas não soa como uma atitude natural. O certo seria que os produtos não precisassem de ‘atalhos’ para vender bem.
Como mostram alguns fabricantes mais consagrados junto ao público, esse artifício não vale o risco. Afinal, se fosse algo positivo, todos teriam aderido, incluindo a Peugeot e a Citroën antes de se juntarem à FCA.
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